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SÃO PAULO, 11 de julho de 2022
SÃO PAULO, 11 de julho de 2022 /PRNewswire/ -- O Conteúdo a seguir é de autoria de Dr. Valderilio Feijó Azevedo. Os medicamentos biológicos são produtos farmacêuticos com complexas características físico-químicas e bioquímicas e seus processos de fabricação têm influência direta em suas atividades orgânicas. Ao contrário dos fármacos sintéticos, com estruturas mais simples e baixo peso molecular, obtidos exclusivamente por métodos químicos, os biológicos são compostos heterogêneos, instáveis, com alto peso molecular e obtidos por biotecnologia.
A produção de um medicamento biológico é realizada em vários estágios que incluem seu desenvolvimento inicial em células vivas geneticamente modificadas, processamento industrial usando métodos de fermentação e purificação e sua biodisponibilidade em formulações inseridas em devices específicos para uso humano.
Indiscutivelmente, os medicamentos biológicos melhoraram o manejo de alguns tipos de câncer e, principalmente, doenças autoimunes com características inflamatórias crônicas especialmente na área de reumatologia, tais como: artrite reumatoide, espondiloartrites axiais e artrite psoriásica. Costumamos dizer que os medicamentos biológicos foram um divisor de águas na terapêutica das enfermidades imunomediadas reumáticas e que a sua história pode ser contada em duas fases didáticas: antes e após a era dos biológicos.
Com os anticorpos monoclonais e as proteínas de fusão pode-se inibir alvos específicos: importantes mediadores da inflamação crônica. No entanto, o alto custo das terapias biológicas também causou um impacto direto nos orçamentos de saúde em todo o mundo, e em muitos países, como o Brasil, os biológicos continuam sendo um dos principais custos relacionados aos gastos com medicamentos.
No sentido do controle dos gastos na saúde e promoção de maior acesso populacional a medicamentos biológicos, os biossimilares — versões altamente similares e de engenharia reversa dos medicamentos biológicos inovadores existentes e seus ingredientes ativos (originadores ou produtos de referência) - surgiram como opções de tratamento menos caras em comparação com produtos de referência para os quais as patentes de exclusividade de mercado chegaram ao fim do prazo.
Agências reguladoras em todo o mundo exigem um processo diferente para a aprovação de biossimilares em comparação com genéricos de moléculas sintéticas. Este processo é baseado em um conjunto complexo de exercícios de comparabilidade aos seus produtos de referência, conhecido como exercício de biossimilaridade.
Do ponto de vista regulatório e clínico, um biossimilar deve ser tão seguro, puro, potente e eficaz quanto o produto de referência baseado em um processo abrangente de comparabilidade, de modo que não haja diferenças clinicamente significativas. As vias regulatórias são construídas para definir se o produto de referência e a nova molécula semelhante oferecem similaridade suficiente em termos de estrutura, pureza e características farmacológicas e clínicas.
Em geral, somente quando todas as características do exercício de similaridade são combinadas, o produto aprovado pode ser definido como um biossimilar. Nos casos em que um produto alega ter alta semelhança com um determinado inovador, mas não forneceu evidências suficientes, de acordo com todas as etapas do caminho regulatório para biossimilares, pode ser chamado de intenção de cópia, mas outros termos como "biomimics" e "biológicos não regulamentados" também têm sido usados para esses produtos, em alguns países.
O primeiro biossimilar de um produto biológico foi aprovado pela agência europeia em 12 de abril de 2006, o Omnitrope, biossimilar do Genotropin, Hormônio de Crescimento. A biossimilaridade só é considerada quando há a totalidade das evidências de todas as avaliações, com cada passo apoiado pelo anterior, conforme detalhado a seguir:
Com os biossimilares surgiram questões pouco exploradas pelos reumatologistas clinicos antes de sua existência, tais como a extrapolação de indicações obtidas em um pequeno número de ensaios clínicos muitas vezes em uma única doença específica, porém sensível para a qual o produto de referência é utilizado. As discussões a respeito da intercambialidade e, sobretudo, a importância crucial da farmacovigilância para um bom controle pós-comercialização de possíveis efeitos adversos destes são fundamentais.
Particularmente, a intercambiabilidade tem se configurado como uma das principais questões em torno dos biossimilares. A intercambialidade é uma característica entre dois ou mais produtos farmacêuticos que indicam que a troca entre esses produtos não representa nenhum risco adicional em termos de eficácia ou segurança para os pacientes durante o curso de seus tratamentos.
O primeiro anticorpo monoclonal biossimilar que abriu as portas regulatórias para outros produtos biossimilares de moléculas mais complexas foi o CT-P13, desenvolvido pela empresa sul-coreana Celltrion, companhia localizada na cidade de Incheon, e que possui duas plantas de fabricação, com grande expertise na área de biotecnologia e produção de biológicos.
A molécula CT-P13 (infliximabe) foi o primeiro biossimilar de um anticorpo monoclonal (MAb) aprovado para comercialização pela EMA, FDA e várias outras agências reguladoras. Sua biosimilaridade com o produto de referência infliximabe foi comprovada por meio de exercícios comparativos que contemplam estudos físico-químicos e farmacológicos, bem como dois estudos fundamentais em doenças reumáticas: PLANETAS (espondilite anquilosante), estudo de fase I e PLANETRA (artrite reumatoide), estudo de fase III.
O estudo PLANETAS, publicado em 2013, incluiu 250 pacientes de 46 centros diferentes em 10 países diagnosticados com espondilite anquilosante. Os resultados demonstraram equivalência terapêutica entre o produto biossimilar e o referência, segundo parâmetros específicos e indicativos da doença. Acima de tudo, não houve diferenças significativas em relação aos eventos adversos. Por outro lado, o estudo PLANETRAS, também publicado em 2013, acompanhou 606 pacientes com artrite reumatoide em 100 centros médicos de 19 países. Novamente, o biossimilar se mostrou equivalente ao referência em termos de resposta ao tratamento na semana 30, não apresentando, também diferenças significativas entre os grupos quanto à segurança.
Assim, a totalidade das evidências apresentadas nesses dois estudos comprovou a equivalência da molécula e garantiu sua aprovação para as patologias citadas acima, e além disso, a extrapolação da indicação para artrite psoriásica, psoríase, doença de Crohn e colite ulcerativa. Embora esses estudos, não tenham apresentado, no início, evidências relacionadas à intercambiabilidade ou ao switch com o produto de referência, vários outros estudos de mundo real têm investigado a eficácia e a segurança da troca entre ambos os produtos, incluindo os estudos de extensão do PLANETAS e do PLANETRA.
No geral, o CT-P13 foi bem tolerado e teve eficácia sustentada ao longo do tempo, comparável ao originador Infliximabe. A totalidade de evidências até o momento indicam que a molécula CT-P13 apresenta eficácia e segurança comparáveis ao infliximabe referência. Além disso, uma grande variedade de estudos indicou uma redução significativa dos custos relacionados à adoção do biossimilar da Celltrion. Países como Reino Unido e Hungria recomendam a prescrição do infliximabe biossimilar a novos pacientes, devido à vantagem econômica. Depois do CT-P13, muitos outros biossimilares foram lançados pela companhia, como rituximabe e trastuzumabe, aprovados pela EMA e FDA; o infliximabe SC, aprovado pela EMA e no Canadá; e o adalimumabe, aprovado pela EMA. A Celltrion se estabeleceu no Brasil recentemente e tem ampliado sua influência no mercado público e privado no Brasil, se configurando até o momento como uma empresa global com grandes interesses de investimento no complexo brasileiro industrial da saúde.
Dr. Valderilio Feijó Azevedo é Professor Adjunto Doutor em Reumatologia da UFPR e coordenador do Fórum Latino Americano de Biossimilares
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Foto - https://mma.prnewswire.com/media/1856907/Dr__Valder_lio.jpg
FONTE Dr. Valderilio Feijó Azevedo, MD, PhD